Você sabia? n.º 46 - Sexta, 01.02.2002
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Você sabia... qual é a origem do léxico português? Pois saiba que ele se compõe de vocábulos:
·
latinos evoluídos (via popular) e de outros que ingressaram posteriormente pela via erudita, com ligeiras adaptações.
· vernáculos (formados no próprio português, geralmente, segundo o modelo latino).
·
importados de línguas estrangeiras.

Vocábulos latinos
- Via popular – Os vocábulos mais antigos de origem latina, os oriundos do latim vulgar, sofreram muitas alterações na forma, através das mudanças fonéticas e da analogia. Contudo, com maior ou menor facilidade, é possível detectar-lhes a origem. Neste grupo estão boca (do latim bucca), árvore (arbore), água (aqua), mau (malu), vinho (vinu), amat (ama, verbo “amar”, assim como todas suas flexões), barata (blatta), praça (platea), lagoa (lacuna – “lacuna”, hoje em uso, entrou mais tarde, por via erudita), leite (lacte), homem (homine), olho (oculu), cadeira (cathedra – “cátedra” entrou pela via erudita) e milhares de outras. Várias palavras do latim vulgar manifestavam mais claramente o caráter afetivo da cultura latina por serem empregadas no diminutivo e foi assim que passaram para o português: enquanto a língua erudita usava auris, a popular preferia auricula, que resultou no português orelha; no latim erudito, havia apis, encontrada na forma diminutiva – apicula – no latim vulgar, que deu abelha em português; genu tinha como diminutivo genuculu, transformada em joelho em português; ovis, preferida no latim erudito, tinha o diminutivo ovicula, empregada no latim vulgar, forma que chegou ao português como ovelha. É evidente que tais diminutivos também existiam no latim erudito, mas eram correntes no popular. Vocábulos há, por fim, que permaneceram intactos na trajetória do latim vulgar para o português e ainda continuam com a mesma forma e sentido: terra, ave, porta, dente, etc. Houve também palavras latinas que nos vieram através do espanhol, do francês e do italiano, como lhano (esp.) e piano (it.), oriundas de planu, e mesmo do inglês, como mídia (de mass media; esta, plural do lat. medium). Com raras exceções, as palavras latinas chegaram ao português a partir da flexão no acusativo (caso do objeto direto), chamado por isso de caso lexicogênico (gerador do léxico). Os vocábulos no acusativo latino terminavam em “-m”, terminação que desapareceu ainda no latim vulgar.
- Via erudita – No Renascimento português (séc. XVI), muitos vocábulos do latim erudito foram resgatados pelos escritores e sábios e introduzidos no léxico português para acompanhar o desenvolvimento científico, tecnológico e social. Quem conhece as leis fonéticas (tendências na transformação fônica das palavras), identifica a procedência culta desses vocábulos, já que não apresentam as mudanças que deveriam ter ocorrido, mas somente pequenas adaptações ortográficas. Nesse caso estão, além das já citadas lacuna e cátedra, pleno (forma transformada – cheio), duplo (dobro), íntegro (inteiro), solitário (solteiro), vagina (bainha), etc. Variante da via erudita é a semi-erudita, pela qual vocábulos cultos, uma vez introduzidos na língua, passaram por modificações fonéticas, como defesa (de defensa) e humanidade (de humanitate). Em outros casos, a forma semiculta convive com a popular: mágoa e malha (de macula), artigo e artelho (de articulus), vício e vezo (de vitium), etc.

Vocábulos vernáculos
Esta classe de vocábulos originou-se dos processos de formação conhecidos por derivação e composição. Assim, de gênio (lat. geniu), formou-se genial; de casa (lat. casa), temos casarão; de cego (lat. caecu), originou-se cegueira, etc.  Os prefixos, sufixos e elementos de composição (portugueses e estrangeiros) também produziram formas vernáculas, como Psicolingüística (do grego psyche), getulista (do antropônimo Getúlio), jambeiro (do sânscrito jambu) e muitas outras. O processo conhecido por “hibridismo” junta elementos de línguas diferentes, como zincogravura (“zinco”, do alemão zink + “gravura”, do francês gravure), automóvel (“auto”, do grego autos, + “móvel”, do latim mobile, através do modelo francês automobile), monóculo (“mono”, do grego monos, + “óculo”, do latim oculu), guarda-mirim (“guarda”, do latim guarda, + “mirim”, do guarani mirim), etc.

Vocábulos importados
A importação de inúmeras palavras de outras línguas enriqueceu nosso léxico e preencheu-lhe as lacunas. São os estrangeirismos presentes no português. Nos últimos anos, porém, tem havido verdadeira enxurrada de palavras estrangeiras desnecessárias, notadamente do inglês, o que configura o vício de linguagem conhecido por barbarismo em sentido restrito. De qualquer forma, os estrangeirismos foram absorvidos e são empregados rotineiramente, como manga – fruta (do malaio manga), cabala (do hebraico kabbalah), hambúrguer (do inglês hamburger), capão – de mato (do guarani caapaũ ), azeite (do árabe al zait), samurai (do japonês samurai), champanha ou champanhe (do francês champagne), pizza (do italiano pizza), caudilho (do espanhol caudillo) e centenas de outras.  

Leia mais em:
Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa, de Antônio Geraldo da Cunha.
Dicionário latino-português
,de Francisco Torrinha.
Do latim ao português, de Edwin B. Williams.
Gramática histórica
, de Ismael de Lima Coutinho.
Gramática histórica
, de Dolores Garcia Carvalho e Manoel Nascimento.
Gramática metódica da língua portuguesa
, de Napoleão Mendes de Almeida.
Saite do prof. Paulo Hernandes, págs. “Você sabia? n.º 5” e Você sabia? n.º 30.

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