Você sabe... o que é brasileirismo?
Brasileirismo é todo o fato lingüístico
peculiar à variedade brasileira da língua portuguesa,
que contribui para distingui-la do português lusitano.
Assim, só devem ser consideradas brasileirismos as
inovações tipicamente nossas, inexistentes agora
ou no passado em Portugal.
Os brasileirismos classificam-se como fonéticos,
morfológicos, sintáticos, lexicais e semânticos.
- fonéticos – Maior
lentidão na fala aqui do que no português europeu.
Vogais pronunciadas de forma mais nítida, mesmo as
átonas.
- morfológicos – Adoção
do pronome de tratamento você como substituto
de tu na maior parte do Brasil. Simplificação
das flexões verbais na língua popular, as
quais normalmente comportam duas formas: a da primeira pessoa
do singular e outra que vale para as demais pessoas. Exemplo:
eu vou, tu vai, ele
vai, nóis vai,
vós vai, eles vai.
- sintáticos - Tendência
à próclise, em contraste com a ênclise,
natural no além-mar. O brasileiro diz normalmente
“Me passe o arroz”, ao passo
que o português fala “Passa-me
o arroz”. Isso se dá porque em Portugal os
oblíquos são mais átonos do que no
Brasil e assim necessitam, de fato, apoiar-se no verbo a
que se ligam. Por aqui, gozam de certa independência
fonética. A disparidade da colocação
pronominal entre Portugal e Brasil decorre, pois, da forma
como portugueses e brasileiros pronunciam as mesmas palavras.
- lexicais – Todos os vocábulos
e expressões criados no Brasil, desde o descobrimento,
e inexistentes em Portugal são brasileirismos. Para
isso, houve importante contribuição indígena
e africana. Citam-se como exemplos canjica, tapera,
chorar pitanga (ou pitangas) e provérbios
como “Por fora, muita farofa; por dentro, molambo
só”.
- semânticos – Trata-se
de:
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novos sentidos atribuídos
por aqui a significantes
comuns a Brasil e Portugal, como cangaço
(Brasil: banditismo nordestino; Portugal: resíduo
de uvas), borrachudo (Brasil: tipo de mosquito,
cheque sem fundos; Portugal: redondo como borracha),
capão [Brasil: porção
de mato isolado no campo; animal (frango, porco, carneiro,
etc.) castrado; Portugal: somente o segundo sentido]; |
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mesmos significados que se associaram
a significantes diferentes aqui e lá, como
“caminho pavimentado para pedestres”,
que no Brasil associou-se a calçada,
ao passo que em Portugal vinculou-se a passeio;
“composição ferroviária”,
que no Brasil associou-se a trem e em Portugal,
a combóio; “grupo de atletas
que praticam alguma modalidade esportiva coletiva”:
no Brasil, time, equipe; em Portugal,
equipa. |
É preciso, contudo, evitarmos considerar
brasileirismos usos que na verdade são puros lusismos,
apenas arcaizados. Como exemplo, citamos a colocação
do pronome reto como complemento verbal, prática encontrada
em diversos textos arcaicos portugueses, como neste de Fernão
Lopes: “El-rei mandou-o logo prender, e levaram ele
e Mateus Fernandes a Sevilha” (Fernão Lopes,
D. Fernando, apud COUTINHO, 1958). Outro falso brasileirismo
é o emprego da preposição “em”
com verbos que indicam movimento, como “Vou na
igreja”. Em “Os lusíadas”, VI, 17-18,
lemos: “Os cabelos da barba e os que decem da cabeça
nos ombros”. Mais um: a flexão
de haver com sentido de “existir”, com
em “Houveram muitas pessoas na solenidade”.
O ilustre escritor português Castilho escreveu: “Chegam
a afirmar haverem por lá, ainda no
século passado, hospitais” (Castilho, A primavera,
idem). Há vários outros.
A verdade é que dois fatores importantes
caracterizam o português brasileiro em contraste com
o lusitano: unidade e arcaicidade, conforme observou Serafim
da Silva Neto. No Brasil, a despeito da imensidão territorial
e da variada imigração européia e asiática,
mantivemos a unidade lingüística. Tanto é
que não possuímos dialetos, mas apenas falares
regionais, enquanto Portugal tem dialetos de norte a sul.
O português brasileiro é arcaico em relação
ao lusitano, especialmente à língua de Lisboa.
Lembremo-nos de que a língua que os colonizadores trouxeram
para o Novo Mundo foi o português do século XV.
Enquanto o falar da metrópole evoluía celeremente,
na periferia, ou seja, na colônia, a língua mantinha-se
mais conservadora. Isso vale para todas as metrópoles,
colônias e ex-colônias. Exemplo clássico
é o emprego generalizado do gerúndio por aqui
(estou trabalhando agora, ficou limpando
os móveis), ao passo que em Portugal tal uso se arcaizou
há séculos e lá se emprega geralmente
o infinitivo nesses mesmos contextos (estou a trabalhar
agora, ficou a limpar os móveis).
Há pronúncias ainda encontradas nas regiões
rurais do interior brasileiro, especialmente do Nordeste,
verdadeiras relíquias, autênticas testemunhas
de estágios lingüísticos já há
séculos superados, como fruita (fruta), dereito
(direito), ermão (irmão), saluço
(soluço), malino (maligno), vĩo (vinho).
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